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"A grande atribuição de uma Procuradoria é fazer com que o gestor atue com segurança jurídica”

A afirmação é da nova procuradora-chefe do IFBA, a advogada pública Ivana Roberta Couto Reis de Souza, que tomou posse na última quinta-feira (28).
por Bárbara Souza publicado: 01/06/2020 10h07, última modificação: 01/06/2020 10h28
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Ivana Roberta é a nova procuradora-chefe do IFBA

Com cerca de 20 anos de experiência na advocacia, a soteropolitana Ivana Roberta - como é conhecida no meio jurídico - tem 43 anos e uma longa e ininterrupta trajetória de atuação em funções de comando como procuradora. Tão logo concluiu a graduação em Direito na Universidade Católica do Salvador, em 2001, foi aprovada no concurso para advogada da Caixa Econômica Federal, função que ocupou por dois anos. Em seguida, ingressou na Procuradoria Geral Federal, na Advocacia Geral da União (AGU), após conquistar sua aprovação no concurso. Naquele mesmo ano, 2003, tomou posse como procuradora no estado do Amazonas, tendo trabalhado em Manaus e no município de São Gabriel da Cachoeira.  Na sequência, foi para a cidade mineira de Diamantina, onde chefiou a Procuradoria Federal Especializada, junto ao Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS). Foi convidada para trabalhar em Brasília, mas cerca de um ano depois retornou a Minas Gerais, para assumir, também a convite, a Procuradoria Federal daquele estado, função que desempenhou por quase seis anos. A trajetória de Ivana Roberta inclui também a chefia da Procuradoria Federal no IF Baiano, por aproximadamente cinco anos. Em maio de 2019, assumiu a titularidade da chefia da Procuradoria Federal no Estado da Bahia, cargo que ocupara anteriormente de forma interina.

Ivana Roberta é a nova procuradora-chefe do IFBA

Nesta entrevista ao Portal IFBA, realizada por meio de aplicativo de mensagens, Ivana Roberta fala sobre o papel da Procuradoria, a importância da parceria entre o órgão e os(as) gestores(as) do IFBA, revela suas expectativas e avalia os desafios que terá à frente da nova função. “A grande atribuição de uma Procuradoria é fazer com que o gestor atue com segurança jurídica”, resume. A nova procuradora-chefe é enfática ao afirmar que “o papel da Procuradoria é de orientação, não é de punição nem de caça às bruxas”.

Portal IFBA: Qual é a principal missão da Projur?

Ivana Roberta: Aqui eu já peço licença para que a gente possa esclarecer como é hoje são intituladas essas procuradorias no âmbito da Procuradoria Geral Federal. [Nota: Projur é o nome que consta no Regimento Geral do IFBA]. Hoje, o título é de Procuradoria Federal junto ao Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia.  Por quê? Porque essa procuradoria, com a criação da Procuradoria Geral Federal, passou a integrar a estrutura da Procuradoria Geral Federal. A própria Lei tirou essas procuradorias de dentro das autarquias – do ponto de vista legal – e as colocou na estrutura da PGF. Ou seja, é um órgão da Procuradoria Geral Federal, que está vinculada à Advocacia Geral da União (AGU).   O nosso papel enquanto órgão de assessoramento e consultoria é de fazer a consulta [às legislações vigentes] e assessorar os gestores que estão vinculados à Instituição. Não só aos gestores, mas de tudo aquilo que disser respeito ao funcionamento da autarquia. Às vezes uma dúvida jurídica surge, por exemplo, de um professor que não está num cargo de gestão, mas está elaborando um projeto. Mas a gente precisa ter cautela porque tudo isso precisa seguir uma tramitação. Oportunamente, a gente vai tratar sobre a tramitação desses casos de consulta direta porque, toda vez que a gente recebe uma consulta de um professor ou de um estudante, a gente tem a obrigação de retornar, de pedir que seja autuado o processo e que haja manifestação da área competente. Às vezes, é uma dúvida da área de ensino, currículo, matrícula, em que a parte jurídica já está pacificada, mas existe uma controvérsia na área de ensino ou de pessoal. A gente sempre pede que haja uma manifestação prévia da área competente, que essa demanda seja encaminhada pelo setor e chegue de maneira organizada à Procuradoria, para que a gente possa atender num fluxo que favoreça a eficiência do trabalho na Procuradoria.  

Portal IFBA:  A Procuradoria assessora juridicamente os gestores do IFBA para que atos e documentos atendam aos parâmetros da legalidade. Em linhas gerais que cuidados, do ponto de vista jurídico, os gestores devem ter sempre para evitar incorrer  - ainda que não o saibam - em alguma irregularidade ou mesmo ferir algum princípio da legalidade?

Ivana Roberta: É muito interessante que as pessoas conheçam as suas atribuições, para que não acabem incidindo em desvio de atribuição, assim como é importante também que os profissionais conheçam os fluxos dos processos, como se forma um processo, saibam que os processos não podem ser desmembrados ...Então, tudo isso faz parte de uma capacitação que independe de consultas jurídicas. A gente tem um programa de Consultoria Ativa que é exatamente através dele que a gente vai procurar o gestor para descobrir qual é aquela formação com a qual a Procuradoria pode contribuir para que ele possa atuar com mais segurança sobre o aspecto jurídico. A grande atribuição de uma Procuradoria é fazer com que o gestor atue com segurança jurídica. A parte do mérito administrativo da conveniência ou oportunidade, não é uma decisão da Procuradoria. Cabe à Procuradoria dizer ao gestor: olha, tem amparo legal, não tem amparo legal, este é caminho legal, para subsidiar a tomada de decisão daquele a quem compete decidir. Então, não é o papel da Procuradoria decidir. Os nossos pareceres eles são opinativos, mas o gestor ele tem a liberdade de, se ele entender que é oportuno, afastar o parecer [da Procuradoria].

Portal IFBA:  Então, o(a) gestor(a) pode decidir “afastar o parecer” e executar o ato administrativo? Ele(a) precisa fundamentar e documentar essa decisão?

Ivana Roberta: Como sempre digo: tudo o que a gente faz no direito e no processo administrativo, a gente precisa motivar [ênfase]. Por exemplo: “Estou afastando esse parecer de exigência de licitação porque no curso dessa licitação aconteceu uma calamidade”.  São circunstâncias que precisam ser avaliadas, motivadas [de novo, enfatiza]. Eu falo sempre isso: toda vez que você for fazer um processo, para você se sentir seguro, motive bem aquilo que você está fazendo. É muito importante que sejamos sempre atentos que não basta que a honestidade esteja no inconsciente coletivo, ela precisa estar materializada no processo, naquele processo que está sendo objeto de análise.

Portal IFBA: Quando um ato de um(a) gestor(a) recebe parecer negativo da Projur, esse(a) gestor(a) fica num primeiro impedido(a) de efetivar esse ato ou procedimento? Mas esse(a) gestor(a) pode, digamos, reapresentar à Projur os documentos relativos ao ato após resolver  os aspectos que levaram ao parecer da Procuradoria Jurídica? 

Ivana Roberta: Importante esclarecer alguns conceitos...Primeiro: não é função da Procuradoria dar pareceres negativos. A gente apenas diz que daquela forma não é viável que a coisa seja feita. Mais além: quando a gente dá esse parecer, dentro dessa perspectiva, a gente já diz qual é o meio legal para que essa coisa seja feita, para que o gestor não sofra nenhum tipo de responsabilização por ferir alguma norma ou lei. Via de regra, como é que a gente faz os pareceres? A gente elenca o que está de acordo com a legislação e diz o que é que falta para que aquilo que não está, fique. É dentro dessa perspectiva que eu pretendo desenvolver, ou melhor, que nós pretendemos – porque somos uma equipe – desenvolver as nossas atribuições da Procuradoria junto ao IFBA.  Ou seja, não existe nenhum aspecto que leva a parecer negativo. Não existe isso. A gente analisa tão somente o enquadramento daquele ato à norma, vê aquilo que não está de acordo com a norma e orienta o gestor a como ficar dentro da norma. O gestor não fica “impedido” de realizar o ato, esse conceito é muito radical. O gestor fica orientado [pela Procuradoria] a como fazer este ato da maneira correta.  A Procuradoria não impede nenhum setor de fazer nada.

Portal IFBA: Este é um esclarecimento importante sobre o papel da Procuradoria...

Ivana Roberta: É um conceito importante que a comunidade do Instituto tenha de forma clara na cabeça: que o papel da Procuradoria é um papel de orientação. Não de punição, não de caça às bruxas, não é nada disso. O nosso papel é mostrar ao gestor o caminho legal, correto. Por exemplo, se você me perguntar: uma sala de aula com 80 alunos é legal? Vou te dizer que dentro do aspecto jurídico não há vedação. Mas, quem vai me dizer se é eficiente do ponto de vista educacional é a Pró-Reitoria de Ensino, é a Pró-Reitoria de Extensão...Enfim, é algo sistêmico e que tem relação com a qualificação técnica e as atribuições das áreas. E a gente tem que respeitar o saber técnico de todas as áreas.

Ivana Roberta: Sou uma entusiasta. E que bom estar no IFBA!

 

 

Portal IFBA: Se eventualmente houver alguma ação - mandado de segurança - contra o Instituto é também a Procuradoria que dá suporte e assessoria jurídica à defesa do IFBA?

Ivana Roberta: Como eu disse, a Procuradoria junto ao IFBA é uma unidade de consultoria e assessoramento. Mas quem faz o contencioso [processos que envolvem ou são passíveis de conflitos de interesses] são os nossos colegas [os procuradores federais]. Mas a Procuradoria que trabalha junto ao IFBA que vai dar a consultoria do ato que foi gerado. Por exemplo, numa licitação que é questionada em juízo: se tiver um parecer da Procuradoria que atua junto ao IFBA, a gente vai conseguir explicar melhor para o colega que vai defender no aspecto contencioso – que ele é especialista – o porquê ou quais os aspectos jurídicos que foram analisados. Essa é uma questão que é muito interessante: a questão do mandado de segurança. É uma coisa que gera muita dúvida. Porque a nossa função não é elaborar essa manifestação, mas a gente precisa deixar o gestor pronto para que ele elabore. Ele tem que saber informar ao juiz o que é que aconteceu naquele processo. Porque manifestação em mandado de segurança é tão somente uma peça informativa. Por exemplo: “Eu fiz essa seleção com observância dos critérios de cota, ou com observância da microempresa”. Então, a gente precisa informar para o juízo o que foi que aconteceu. Só isso. E a defesa judicial, com os termos jurídicos, com as normas que se aplicam, aí já é um papel que é do procurador. A informação é do gestor que tomou a decisão, a defesa é da parte contenciosa. Inclusive, a parte contenciosa pode dizer ao gestor que o que foi feito, de fato, não está adequado à norma. E a gente recuar, ajustar, porque nossa advocacia é uma advocacia preventiva e reparativa. Porque se a gente errou, quanto mais rápido a gente corrigir, mais levada a sério será a instituição. Porque errar, todo mundo erra. Então, se você tem a oportunidade de corrigir, corrija logo, no primeiro momento, que é exatamente esse momento em que há a intimação para prestar as informações daquilo que aconteceu.

Portal IFBA: Quais são os problemas mais comuns que chegam à  Procuradoria numa instituição da natureza do IFBA? Conceitualmente, como evitá-los?

Ivana Roberta: Outra pergunta interessante...A gente fala que o mundo dos fatos é sempre muito mais rico que o mundo do Direito. Então, sempre vai acontecer alguma coisa no mundo fático que é muito mais à frente do que o Direito pode normatizar. A gente tenta elucubrar, divagar sobre aquilo que pode acontecer, mas os fatos sempre estarão à frente do Direito. Então, os problemas mais comuns são de todo gênero. Mas o mais comum é o desconhecimento e é por isso que há importância dessa consultoria ativa, e há a importância também de um envolvimento de todas as áreas respectivas nessa capacitação para que levem essa informação. Porque hoje em dia a gente tem uma sociedade com excesso de informação e falta de informação. O que eu tenho percebido mesmo é que a grande carência é de fazer com que os problemas a serem evitados o sejam a partir da informação. É disso que estamos carentes: de transformar a informação em formação.

Portal IFBA: Considerando que determinados atos da Gestão  - como a realização de licitações, contratos e convênios - dependem do parecer prévio da Procuradoria para a sua efetivação, esses atos ficam, ainda que precaução, em suspenso até que a Projur se manifeste formalmente sobre eles, é isso? Se sim, é de se supor que haja uma expectativa dos gestores quanto à celeridade nas respostas da Procuradoria.  Mas o volume de demandas da Procuradoria é grande. Como assegurar essa celeridade e a qualidade dos pareceres? 

Ivana Roberta: Existe uma previsão legal, que é a Lei de Processo Administrativo, que define que nós temos 15 dias úteis para elaboração de parecer. Na verdade, existem dois tipos de situação e a gente fica muito sensível para que a gente possa analisar com critério. Às vezes existe mesmo aquela urgência: é uma pandemia, os estudantes precisam se alimentar, a gente precisa dizer se pode dar o auxílio, se não pode dar, se pode entregar a comida, se pode dar o ticket, isso é urgência. Agora, existe muito também, na administração, a urgência criada pela inércia. Todo mundo sabe que o contrato vai vencer no dia 31 de maio e aí começa a formatar o processo no dia 10 de maio. Então, essa urgência é uma urgência praticamente provocada, assim...não provocada, mas não é uma urgência de fato. A gente precisa separar esses dois conceitos para que a gente tenha planejamento. Porque se eu sei que um contrato vai vencer daqui a 60 dias, e eu quero renová-lo, eu tenho que adotar medidas no sentido de deixar o processo instruído para essa prorrogação agora. A gente, da Procuradoria, tem essa sensibilidade, a experiência traz para a gente essa sensibilidade de saber fazer esse discernimento daquilo que realmente é urgência, que pegou os gestores de surpresa – caso de calamidades, uma enchente, uma pandemia. A própria legislação, para poder autorizar as hipóteses de dispensa [de licitação], ela já diz aquilo que é chamado de urgência. A gente trabalha também dentro da prospecção de criar mecanismos para que as coisas sejam céleres. Por exemplo: já fizemos um parecer referencial número 01, que foi o parecer referencial para dispensa de licitação para aquisição de gêneros alimentícios, decorrentes do Pronaf [Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar]. Esse parecer referencial, toda vez que chegar um processo igual, a gente vai dizer: olha, só faça a análise se estiver de acordo com esse parecer referencial. Com isso, a gente vai organizando a Procuradoria para que esses processos tramitem com maior celeridade, principalmente se tratando de matérias urgentes, coisas que não podem esperar como é o caso de alimentação.

Portal IFBA: Quais são as suas expectativas à frente da Procuradoria?

Ivana Roberta: As minhas expectativas são as melhores. Eu adoro desafio e eu tenho um carinho muito grande pelas escolas técnicas – é que eu só antiga. Porque meu pai repetia Juscelino [Kubitschek], que dizia que o mundo de hoje vai sair das universidades e o do futuro vai sair das escolas técnicas. Então, meu pai sempre me ensinou a respeitar muito essa formação técnica. Acho muito interessante que essas formações foram além e que hoje já temos dentro desses ambientes cursos de pós-graduação, lato e stricto sensu, o que demonstra que a visão que se tinha era muito menos ousada do que de onde se conseguiu chegar esse tipo de formatação de educação, de ensino e de projeto. Minha expectativa é de poder colaborar para que haja viabilidade jurídica para que isso continue acontecendo. Porque esse é meu papel. Eu sou uma entusiasta, eu, Ivana. Mas a procuradora federal Ivana Roberta precisa fazer com que esse entusiasmo dela se transforme em ações que viabilizem, do ponto de vista jurídico, essa continuidade e esse crescimento da instituição.  A comunidade do IFBA pode estar certa de que eu darei o meu melhor.

Portal IFBA: Qual a senhora considera ser o seu principal desafio à frente da Projur?

Ivana Roberta: Na verdade, na verdade, quando a gente se predispõe a enfrentar o novo, tudo o desafiador. Cada trabalho que você faz é um trabalho novo. Meu desafio é estar à frente da Procuradoria Federal junto ao IFBA, sabe? E saber que ali dentro o meu dia a dia será um dia a dia de desafios. Porque o mundo real é um mundo de desafios inusitados.  A gente não tem dois dias iguais. E é bom que não tenha mesmo. Porque é isso que mantém viva na gente a vontade de fazer o nosso melhor. Meu maior desafio hoje é estar próxima da altura da missão que ora me está sendo atribuída. Eu prometo a vocês que vou dar o meu melhor. Vou acertar, posso falhar, mas estarei dando o meu melhor. Isso, eu prometo!

Portal IFBA: Há algum outro assunto ou aspecto que julga importante acrescentar?

Ivana Roberta: De verdade, eu não gosto muito de falar na entrada.  Existe uma máxima na Procuradoria, de que só quem fala é quem sai. Quem entra, entra calado, faz o trabalho e depois pode falar do trabalho que fez. O que eu tenho para dizer é: contem comigo. Eu falo assim: tudo o que eu tenho hoje na minha vida, que é fruto do meu trabalho, é fruto do meu trabalho na Advocacia Geral da União. Então, eu tenho muita gratidão por ser procuradora, por estar onde eu estou. Então, eu me sinto na obrigação de devolver isso em trabalho para o lugar onde eu estiver. E agora que bom que é no IFBA. É uma casa que eu já conheço, minhas duas irmãs são egressas do Cefet, minha mãe estudou no Cefet, então minha missão está triplicada. Porque tem três vidas que foram bem sucedidas, que têm a expectativa de que eu possa agregar o melhor possível a essa instituição, que já favoreceu muito a formação da minha família. Registro também a minha gratidão pela oportunidade de poder falar, de trocar essa ideia com você, nesse momento bastante delicado que estamos vivendo. Há que se respeitar que a gente está no meio de uma pandemia.  Eu até peço que não me poupem por isso, mas eu vou pedir a vocês que poupem as pessoas que estão à frente disso, que estão sofrendo com isso – não que eu não esteja sofrendo – mas agora eu preciso ser escudo de uma equipe, preciso ser escudo para ajudar nosso corpo docente, nosso corpo discente, nosso corpo de técnicos. É isso: contem comigo!